Desembargador reconhece ‘rachadinha’, mas não vê crime na divisão de salários

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Por Mateus Gusmão

O ex-vereador Vander Temponi, atual assessor parlamentar da Prefeitura de Volta Redonda, viveu um período nebuloso desde 2023, quando foi acusado pelo Ministério Público de, supostamente, liderar uma organização criminosa que estaria praticando ‘rachadinha’ em seu gabinete. Conforme denúncia feita pelo MP, o esquema ocorria quando os assessores faziam o repasse de parte dos seus salários ao parlamentar. Em abril do ano passado, Temponi foi condenado a 25 anos de prisão em regime fechado (recorreu em liberdade). Além dele, foram condenados os assessores Celso Diniz e Luciana Delgado a 13 anos de prisão cada um. Já a ex- assessora Ana Luiza Sandin foi absolvida das acusações.

A decisão foi do juiz da 3ª Vara Especializada em Organização Criminosa do Tribunal de Justiça do Rio, Alexandre Abrahão Dias Teixeira. Só que, agora, Temponi e seus assessores condenados foram absolvidos da ação criminal movida contra eles pela 6ª Câmara Criminal do Tribunal Justiça do Rio de Janeiro. O relator do caso foi o desembargador Fernando Antônio de Almeida. O detalhe é que o desembargador confirmou que, através de provas, o MP supostamente teria conseguido apontar que de fato existia a prática de ‘rachadinha’ no gabinete de Temponi. Mas para o magistrado a prática não seria suficiente para ser considerada crime.

Em sua decisão, o desembargador destacou que há uma grande discussão sobre ‘rachadinha’ e diferentes correntes doutrinárias. E que nesse debate uma questão central seria se os servidores que devolvessem dinheiro estariam prestando serviços à administração pública ou se seriam servidores- fantasmas. “Isto porque a ‘rachadinha’ não configura, necessariamente, um crime em todos os casos, pois, se não houver prejuízo direto ao erário ou apropriação indevida de recursos públicos, a prática não se amoldaria nos delitos de peculato ou corrupção”, justificou.

O desembargador Fernando Antônio de Almeida destacou ainda que a entrega de parte do salário como retribuição a um trabalho efetivamente prestado pode configurar mera liberalidade, sendo uma prática informada por acordos que não envolvem, necessariamente, um desvio ou apropriação de dinheiro público. Tem mais. Ele destaca que ficou comprovado no processo que os três assessores de Temponi trabalhavam efetivamente e não eram funcionários-fantasmas da Câmara de Volta Redonda.

“Desse modo, percebe-se que o repasse de parte do salário ao vereador, em contrapartida à nomeação ao cargo, não configura qualquer ilícito penal, vez que, a partir do momento em que o funcionário recebe as verbas às quais tem direito pelos serviços prestados à administração, ele possui a faculdade de utilizar o dinheiro da forma como preferir, inclusive, doando o a qualquer pessoa”, salientou o magistrado, ressaltando que seria um direito dos assessores devolver parte dos salários caso quisessem.

O magistrado diz que não se pode negar que a prática de ‘rachadinha’ constitui um ilícito moral, devendo ser apurada na esfera administrativa, para que se verifique a possível ocorrência de improbidade. “No entanto, não cabe enquadramento de tais atos no direito penal”, disse. “Transferir voluntariamente parte de seu salário obtido em contrapartida a um trabalho efetivamente prestado à administração pública não configura peculato, vez que não há a prática de ‘apropriação’ narrada no tipo penal atribuído aos réus”, completou.

O desembargador garante que nos autos do processo foi produzido farto material que prova o acordo entre Temponi e seus assessores. “Verifica- se que foi produzido farto material probatório atestando o acordo entre as partes para nomeação de cargo na administração pública em troca do repasse de parte da remuneração auferida. Contudo, conforme já salientado, tal prática, por si só, embora seja considerada imoral, não se traduz em ilícito penal, sendo a conduta dos réus, portanto, atípica”, concluiu. A decisão da 6ª Câmara Criminal do Tribunal Justiça do Rio de Janeiro foi proferida na terça, 25. Mas o Ministério Público, responsável pela acusação, pode recorrer.

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