Márcio Macêdo, atual secretário-geral da Presidência, vê em sua sombra o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP), sondado pelo presidente Lula (PT) para o posto, conforme apuração da CNN.
“Em relação a mim, ele (Lula) nunca tratou sobre reforma ministerial. O presidente nunca conversou comigo. Portanto, eu estou aqui e continuo trabalhando, que é o meu dever”, afirmou Macêdo em entrevista à CNN na sexta-feira (16).
Na quinta (15), Macêdo e Lula, que voltavam de viagem à China, estiveram no velório de Pepe Mujica no Uruguai. Boulos também acompanhava a comitiva do governo. O ministro nega que uma eventual mudança tenha sido assunto entre os três na viagem.
São quatro os ministérios políticos sediados no Palácio do Planalto, sendo a Secretaria-Geral da Presidência, que faz a interlocução do governo federal com os movimentos sociais, um deles.
Se Macêdo cair, apenas o titular da Casa Civil, Rui Costa, que assessora diretamente à Presidência da República, restaria como o ministro palaciano que está no governo Lula III desde o início.
Veja a íntegra da entrevista de Márcio Macêdo à CNN:
CNN: Esta semana, o governo anunciou um acordo com os moradores da Favela do Moinho, no centro de São Paulo, mas a notícia também é a saída do senhor da Secretaria-Geral da Presidência. O senhor está trabalhando ou arrumando as gavetas para deixar o Palácio do Planalto?
Márcio Macêdo: Deixa eu falar sobre o trabalho, e depois a gente fala sobre as especulações.
Primeiro, esse episódio da Favela do Moinho é um problema que vem se arrastando ao longo dos anos. É um problema social sério.
O governo federal, através da SPU (Secretaria de Patrimônio da União), estava negociando com o governo do estado para ceder o terreno para o estado. Em contrapartida, [o governo de São Paulo iria] resolver o problema social da comunidade, com as pessoas que vivem na favela.
Fomos surpreendidos com uma ação policial que, pelas informações da comunidade, das pessoas que ali estavam e dos parlamentares que a acompanharam, foi com muita truculência e violência. Então, entrei nesse processo para ajudar na negociação com o governo do estado. Dialoguei e coloquei a nossa discordância à ação da forma ostensiva e violenta da polícia. Porque polícia tratar com violência tem que ser com bandido; com o povo, tem que ser um diálogo para resolver os problemas da população.
Ontem (quinta, 15), nós estávamos no estado de São Paulo em duas frentes. Uma estava dialogando com o governo do estado, através do ministro (das Cidades) Jader Filho e da ministra em exercício do Ministério da Gestão, Cristina (Mori) — eu não estava porque estava viajando com o presidente para o velório e enterro do Pepe Mujica (ex-presidente do Uruguai).
Outra frente estava dialogando com a comunidade, dentro da Favela do Moinho, liderada pela minha secretária-executiva, Kelli Mafort, e com a presença das equipes técnicas dos diversos ministérios envolvidos nesse processo: das Cidades, MGI, Direitos Humanos, a SPU…
Foi feito um processo de diálogo onde apresentamos uma proposta para tirar as pessoas de lá. O governo federal iria entrar com R$ 180 mil por família e propusemos que o governo do estado entrasse com 70 mil — então: R$ 250 mil por família para poder comprar uma casa digna para as pessoas na região central de São Paulo. E que, nesse tempo de negociação — de encontrar a casa, a família aprová-la e comprá-la —, as pessoas possam ir para um aluguel social, que estava por R$ 800,00 e que solicitamos e dialogamos que fosse R$ 1.2 mil, para que as pessoas pudessem encontrar uma casa com dignidade.
Polícia tratar com violência tem que ser com bandido; com o povo, tem que ser um diálogo para resolver os problemas da população
Márcio Macêdo, secretário-geral da Presidência
Consideramos uma ação bem-sucedida a que fizemos nesse início e vamos, agora, acompanhar esse processo, continuar dialogando com a comunidade, para que o desfecho final seja no mesmo caminho do seu início: com sucesso e que as pessoas possam ir para suas casas. Que saiam de lá, mas que vão direto para as suas casas para viver com dignidade.
O governo federal vai discutir com o governo do estado a cessão dessa área para que ela seja utilizada pelo governo do estado, mas em programas que tenham alcance social e que beneficiem o povo de São Paulo.
CNN: O senhor mencionou que estava acompanhando o presidente Lula na viagem para o velório do Pepe Mujica. Quem participava desse voo foi o deputado Guilherme Boulos, que tem sido citado como o seu sucessor na Secretaria-Geral da Presidência. O senhor, o presidente e o deputado trataram desse assunto?
Márcio Macêdo: Não tratamos de assunto de reforma, nem de saída de nenhum ministro, nem de entrada de outra pessoa — muito menos a minha saída ou a entrada do deputado Guilherme.
Esse assunto da reforma ministerial nunca foi tratado no governo. O presidente nunca falou de reforma ministerial. Ele mudou quem ele achou que tinha que mudar pontualmente: ou por ajuste na gestão, ou por decisão pessoal dele, ou por necessidade política — no caso dos ministros dos partidos aliados.
Em relação a mim, ele (Lula) nunca tratou sobre reforma ministerial. O presidente nunca conversou comigo. Portanto, eu estou aqui e continuo trabalhando, que é o meu dever. E é isso que estou fazendo, focado no meu trabalho.
Compreendo a natureza do cargo que exerço. O cargo é do presidente da República e ele tira e coloca quem ele quiser, a hora que ele quiser. Isso vale para mim e para qualquer outro ministro. Isso está muito bem resolvido na minha cabeça.
O que tenho que fazer é cumprir o meu papel e trabalhar. Não vou estar movido por especulação, fofoca política ou comentários. Trabalho com o fato concreto, e o fato concreto é que esse assunto nunca foi discutido comigo e, portanto, eu continuo fazendo esse trabalho que o presidente Lula me determinou.
E quero dizer que estou muito feliz com o que estou fazendo. Acho que o que estamos fazendo é algo muito significativo para o país.
Quero lembrar vocês que, quando chegamos ao governo do Brasil, no dia 1º de janeiro de 2023, nós encontramos um país que tinha sido desmontada toda a participação social nos últimos seis anos, em especial nos últimos quatro anos antes da nossa chegada. As conferências tinham sido, em sua maioria, canceladas. As estruturas de participação da sociedade nas políticas públicas, aniquiladas.
O que tenho que fazer é cumprir o meu papel e trabalhar. Não vou estar movido por especulação, fofoca política ou comentários
Márcio Macêdo, secretário-geral da Presidência
Instituímos, no primeiro dia em que o presidente Lula entrou, o Conselho Nacional de Participação Social. Fizemos um PPA Participativo (Plano Plurianual Participativo 2024-2027) em um país continental como esse. Criamos o Conselho Interministerial de Participação Social. Todos os ministérios têm uma assessoria de participação social e um endereço oficial para que a sociedade brasileira possa se dirigir. Criamos o G20 Social.
Agora, estamos em uma fase de interiorização da participação social. Criamos um fórum de participação social nos 27 estados federados para ser um ambiente de debate da democracia, em que se possa discutir as políticas públicas do presidente Lula no estado: o que está funcionando? O que não está funcionando? O que precisa melhorar? O que precisa ser feito?
Apesar de sermos um “ministério meio”, que está fazendo articulação política, estamos fazendo entregas. Estou muito tranquilo do que estamos fazendo e em paz. O que tenho que fazer é trabalhar e cumprir o meu papel, que o presidente Lula me delegou.
Estou fazendo isso com muito zelo, foco e determinação, e com muita felicidade de estar ajudando o meu país no projeto que acredito, ajudei a construir e que dediquei a minha vida inteira. Sou um militante: me preparei tecnicamente, conceitualmente e politicamente para servir ao meu país.
CNN: O senhor é um homem de missões: foi tesoureiro na campanha do presidente Lula e, aí, o presidente precisava de alguém para fazer essa rearticulação dos movimentos sociais, e o senhor foi. E parece que o presidente vê o senhor como necessário no PT, depois da eleição do novo presidente (do partido). Se o presidente Lula quiser, o senhor topa assumir um cargo na direção executiva do PT?
Márcio Macêdo: Eu fui tesoureiro nacional do PT em um momento muito delicado: tínhamos companheiros presos, o partido passava por endividamento e fui lá, cumpri a missão que o presidente e a direção nacional me deu. Cumpri e saí com o PT sem dever nada a ninguém: com o dinheiro em caixa, se fez a pré-campanha de Fernando Haddad (2018) e as caravanas do presidente Lula.
Essa missão eu já cumpri. Tem outros companheiros que pleiteiam essa missão e que têm toda a competência para fazer.
Sou um militante: me preparei tecnicamente, conceitualmente e politicamente para servir ao meu país
Márcio Macêdo, secretário-geral da Presidência
Trabalho com coisa concreta: a missão que o presidente me deu foi ser ministro de estado da Secretaria-Geral da Presidência e eu vou cumprir esse papel até o dia em que ele assim desejar e quiser, porque ele é o dono dos cargos. O povo lhe outorgou por quatro anos o direito de ele indicar os seus ministros — e eu espero que ele seja renovado por mais quatro anos; vou trabalhar para isso.
CNN: E por que a direita bota mais gente na rua do que a esquerda hoje?
Márcio Macêdo: Acho que isso é muito relativo. Tem alguns momentos que a direita bota mais gente, e tem outros momentos que a esquerda bota mais gente. Isso faz parte da conjuntura de algum momento.
O fato é que estamos vivendo um momento muito delicado da democracia, porque o avanço da extrema-direita no mundo e no Brasil é uma coisa muito forte. Os trilionários do mundo resolveram financiar a extrema-direita com investimentos de recursos e tecnologia num fenômeno recente, que são as redes digitais e que, com fake news e desinformação, corre risco a democracia, o governo e a imprensa profissional.
Eu vou cumprir esse papel até o dia em que ele assim desejar e quiser, porque ele é o dono dos cargos
Márcio Macêdo, secretário-geral da Presidência
Nós, democratas do Brasil, precisamos nos unir para enfrentar e derrotar a extrema-direita e fortalecer os valores civilizatórios da humanidade, de fraternidade, de igualdade, de justiça social. É nas ruas e nas redes que temos que combater a extrema-direita e esse processo de ódio, de intolerância, de fake news e de mentiras. É isso que estamos trabalhando.
O governo, o movimento social e os partidos do povo têm que cumprir o seu papel. E os democratas do Brasil, sejam eles de qualquer matriz ideológica, mas que tenham a democracia como princípio fundamental na vida pública, devem estar juntos para defender a democracia brasileira.
* Com informações e colaboração de Basília Rodrigues, Débora Bergamasco, Henrique Sales Barros, Iuri Pitta e Pedro Venceslau