A Comissão de Segurança Pública (CSP) do Senado Federal aprovou nesta semana um projeto de lei que permite o uso de bancos de dados civis de órgãos públicos como padrão de comparação em perícias criminais.
A medida deve impactar as investigações nas polícias civis estaduais e os inquéritos na Polícia Federal.
Segundo o autor do projeto, senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR), muitos órgãos públicos, como o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), possuem um extenso banco de dados biométricos, enquanto os bancos de dados das polícias costumam ser reduzidos porque eles são coletados apenas em investigações criminais.
Atualmente, as polícias acessam os bancos de dados de outros órgãos por meio de acordos de cooperação.
Investigadores, no entanto, alegam que a falta de uma legislação que autorize expressamente essa possibilidade pode gerar questionamentos sobre a validade das provas, sem segurança jurídica.
Para o presidente da Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais (APCF), Willy Hauff, a aprovação da proposta foi uma vitória “não só à perícia”, mas também à persecução penal.
“Toda a prova constituída em sede do processo criminal tem que ser idônea e atender à finalidade. Bancos de dados civis não têm finalidade ‘criminal’ e quando de sua criação não foram previstos para servirem de meio de prova. Existem bancos de dados que nasceram com natureza criminal como o banco de DNA e o banco balístico e são fontes irrefutáveis de prova, além de terem padrões e parâmetros muito mais exigentes. Já os bancos civis como a base eleitoral do TSE tem finalidade apenas eleitoral e parte de premissas próprias”, explica.
Segundo Hauff, eventualmente a perícia precisa se valer de outros bancos para tentar identificar possíveis riscos infratores, e, uma vez esgotados os bancos criminais, restam os dados dos bancos civis, e que já eram, por vezes, utilizados mas demandavam autorização judicial específica.
“Agora estes já podem ser utilizados diretamente e podem constituir mais uma ferramenta que ajudará a elucidar e apurar os crimes e infrações penais”, completa o perito.
Para Lucas Paglia, especialista na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), é preciso elencar que o compartilhamento de dados no poder público se difere do compartilhamento do poder privado.
“Hoje esse compartilhamento já existe sem uma regra, e é esse o problema. Então a ideia principal é que a gente tenha, a partir de uma regra, questões específicas que podem colocar e impor limites, que imponham mais transparência, que imponham mais finalidades, que imponham regras e ordenamentos para que esse uso, para que essa utilização, esta finalidade, como a lei fala, ela tenha legalidade. Então, o grande tópico da discussão é o compartilhamento hoje já existe, carece de uma regulamentação”, pontua.
Também especialista na LGPD, Eduardo Nery ressaltou que a atual legislação traz uma série de obrigações ao Poder Público para o tratamento de dados pessoais, principalmente os dados considerados sensíveis, como os dados biométricos.
“Entretanto, a própria LGPD dispõe, em seus artigos, que ela não será aplicada nos casos de tratamento de dados pessoais utilizados para atividades de investigação e repressão de infrações penais. Mesmo assim, ela traz a obrigatoriedade de elaboração de uma lei específica para o uso de dados pessoais nesses casos, ressalvando a necessidade de respeito aos direitos dos titulares de dados, ao devido processo legal e aos princípios gerais de proteção”, observa.
“Esse não é o caso do projeto aprovado pelo Senado, que não é uma lei específica capaz de regular o tema”, conclui Nery.
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