Por Pollyanna Xavier
Pelo terceiro ano consecutivo, Volta Redonda deixou de receber uma bolada do Estado, referente aos repasses do ICMS Ecológico – mais conhecido como ICMS Verde. O motivo é o mesmo dos últimos anos: a prefeitura não realizou as ações de remediação da área do antigo lixão, às margens da Rodovia dos Metalúrgicos. O depósito foi desativado em 2012, mas permanece ativamente poluente, graças às piscinas de chorume que transbordam nos períodos chuvosos, poluindo os cursos d’água que passam pela Floresta da Cicuta. Um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) já foi assinado com o MPF para remediação do vazadouro, mas até agora nada foi feito.
A remediação do lixão é responsabilidade da prefeitura de Volta Redonda, que nos últimos 27 anos depositou no local todo o lixo produzido na cidade do aço. O passivo já rendeu, além do TAC, duas ações civis públicas, várias multas e a perda de parte da arrecadação. Na pior das hipóteses, poderia enquadrar o prefeito Neto na Lei de Responsabilidade Fiscal, por renúncia de receita. Samuca, ex-prefeito, também. O fato é que a remediação do lixão compõe o cálculo do mecanismo tributário, garantindo à cidade do aço uma fatia bem maior do imposto ecológico. Sem remediação, não há repasse.
Toda a parte burocrática para a recuperação
da área degradada já foi feita. A prefeitura, inclusive, realizou estudos hidrogeológicos, geológicos, geomorfológicos, sondagens, implantação de poços de monitoramento e até obteve duas Licenças Ambientais de Recuperação (LAR), nos últimos anos, para remediar o lixão. Mas, apesar de todo o aparato técnico, a obra – que anularia os efeitos nocivos da contaminação do chorume no solo e garantiria a recuperação total da área – não saiu do papel.
Durante a semana, o aQui teve acesso a uma cópia da última Licença Ambiental de Recuperação (LAR), obtida pela prefeitura junto ao Instituto Estadual do Ambiente (Inea-RJ). Nela, consta a informação de que uma das licenças emitidas chegou a ser prorrogada a pedido da própria prefeitura, porém, sem necessidade, já que a obra nunca foi feita. O que chama a atenção é que o último processo de licenciamento, que é justamente este a que o aQui teve acesso, foi assinado no dia 11 de abril de 2021, com vigência de três anos, ou seja, a última LAR venceu há pouco mais de 45 dias.
A falta de providências ambientais impediu que milhões de reais entrassem nos cofres do município. Para se ter uma ideia da perda, Barra Mansa recebeu, em 2024, quase R$ 3 milhões (R$ 2.816. 864,71) de ICMS Verde pela remediação do seu antigo lixão. O drpósito, localizado no km 7 da Estrada Bananal, foi encerrado em 2021 e desde então vem passando por obras de remediação e recuperação do solo. Por estas ações, a prefeitura de Barra Mansa já conquistou o prêmio ICMS Ecológico, oferecido pela secretaria de Estado de Ambiente e Sustentabilidade, e ainda atingiu os melhores índices, recebendo uma fatia gorda do imposto.
Simultaneamente ao encerramento do lixão de Barra Mansa, a prefeitura inaugurou, no km 6 da mesma estrada, o Centro de Tratamento de Resíduos, que recebe diariamente 750 toneladas do lixo produzido na cidade. O volume está aquém da capacidade instalada, que é de 950 toneladas/dia, o que faz com que Barra Mansa auxilie outras cidades da região no tratamento do lixo. Pela destinação correta dos resíduos sólidos, o município embolsou no ano passado R$ 1.124.959,74 de ICMS Verde, sendo o maior repasse nesta categoria aos 92 municípios do estado.
Volta Redonda recebeu um pouco menos – R$ 55.494,69 – o que a colocou em 7o lugar no ranking estadual de tratamento de resíduos sólidos. Na frente estão municípios com populações bem menores, como São José do Ubá, que recebeu R$ 1.017.331,42, e Vassouras, que arrecadou R$ 1. 071. 776,59. Os dados citados constam no ranking do ICMS Ecológico para 2023. O deste ano ainda não foi divulgado, porque os municípios estão na fase de apresentar documentação que comprove o cumprimento das metas. Para o repasse, são considerados critérios ambientais como a conservação de áreas protegidas, a qualidade ambiental dos recursos hídricos, coleta e tratamento de esgotos, preservação de mananciais, destinação de resíduos sólidos e a remediação de lixões.
No ranking geral – que reúne todos os critérios de conservação ambiental para a divisão do imposto –, Volta Redonda ficou em 33o lugar, recebendo um total de R$ 3.399.378,55, enquanto que municípios da região como Piraí (29a lugar), Resende (28o lugar),
Barra Mansa (24o), Itatiaia (17o) e Rio Claro (2o) ocuparam posições à frente, fazendo jus a uma arrecadação bem maior. Rio Claro, por exemplo, embolsou R$ 12,2 milhões, já
Barra Mansa – o município vizinho mais próximo da cidade do aço – recebeu R$ 4,5 milhões. Na comparação com a versão 2022/2023 do ranking, Volta Redonda se manteve na mesma posição (33o lugar), mas recebeu um repasse maior – R$ 4,4 milhões.
Em 2012, quando Neto foi prefeito pela quarta vez, ele chegou a encomendar um estudo para a remediação do lixão, contratando os serviços da empresa Carioca Vereda Estudos e Execação de Projeto. Na época, o ICMS Ecológico já era distribuído entre os municípios que privilegiavam a manutenção de biomas, e a ideia era remediar o lixão a fim de alcançar metas, cumprindo todos os indicadores previstos no tributo verde. O problema era que, apesar de cumprir todas as exigências, a execução da obra sairia muito cara: em torno de R$ 9,1 milhões.
Samuca Silva chegou a retomar o estudo da Veredas, promovendo reuniões entre sua equipe do Meio Ambiente para tentar solucionar o problema. Porém, alegando falta de recursos, Samuca reduziu o projeto e disse que só iria tratar dos vazadouros. O valor cairia para mais da metade, e foi dada a ordem de execução. Misteriosamente, o projeto voltou para a gaveta e a remediação foi novamente adiada. A perda de repasses, por três anos consecutivos, parece não ter abalado os cofres municipais. Uma pena, tanto do ponto de vista ambiental quanto do econômico.
Versão
Procurada, a prefeitura de Volta Redonda disse que nos últimos quatro anos arrecadou mais de R$ 13 milhões em ICMS Ecológico (ver tabela). Para ser exato, o valor repassado pelo Estado teria sido de R$13.154,113,89, referentes aos anos de 2021 a 2024. Os valores indicam o cumprimento de metas nas áreas de unidade de conservação, conservação municipal, tratamento de esgotos e destinação de resíduos sólidos. De fato, a prefeitura vem cumprindo metas nestas quatro áreas nos últimos anos, mas tem falhado na remediação do vazadouro do lixão municipal e, por essa falha, tem deixado de receber um repasse ainda maior.